quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Grupo f/64 e a busca pela "imagem pura"

Não é de hoje que se discute a manipulação de imagens - mais conhecida como "pós-produção". Já em 1932 um grupo de fotógrafos americanos, que entrou para a história como "Grupo f/64" (referência à menor abertura possível para uma lente na época, o que significa uma grande profundidade de campo e o consequente detalhamento da imagem), defendia a tese de que a fotografia não deveria estar presa a conceitos e modismos oriundos de outras artes, como a pintura. Além disso, deveria preservar ao máximo as características das fotos: nitidez, profundidade de campo, foco extremamente preciso, entre outras características que garantiriam à fotografia um realce expressivo dos detalhes. Além disso, a impressão se dava em papel brilhante e acetinado, o que garantiria a preservação do processo fotográfico genuíno.
Entre os integrantes do grupo estavam os fotógrafos Ansel Adams, Edward Weston, Willard Van Dyke e Imogen Cunningham. O manifesto lançado pelo f/64 ajuda a entender um pouco mais da proposta do grupo:


"- O nome do grupo deriva do número do diafragma das lentes fotográficas. Significa que se estendem ao máximo as qualidades de clarividência e definição da imagem fotográfica, que é um elemento importante no trabalho dos membros deste grupo.
- O objetivo principal do grupo é apresentar, em mostras frequentes, o que é considerado o melhor da fotografia contemporânea do Ocidente; além da mostra do trabalho dos membros do grupo, incluirá impressões de outros fotógrafos que evidenciem no seu trabalho tendências similares às do grupo.
- O Grupo F/64 não pretende dominar toda a fotografia ou indicar, através da sua seleção de membros, nenhuma opinião depreciativa de fotógrafos que não estão incluídos na mostra. Existem muitos trabalhadores da fotografia cujo estilo e técnica não estão relacionados com o domínio do grupo.
- O Grupo F/64 limita os seus membros, nomes individuais ou aqueles que lutam para definir a fotografia como uma forma de arte, a uma representação simples e direta através de métodos fotográficos. O Grupo não mostrará nenhum trabalho, em qualquer momento, que não esteja conforme o padrão da "fotografia pura". Os membros do Grupo F/64 acreditam que a fotografia enquanto forma de arte deve desenvolver-se ao longo das linhas definidas pela atualidade e limitações do meio fotográfico e deve manter-se sempre independente das convenções ideológicas da arte e da estética, que são reflexo de um dado período e cultura anteriores ao crescimento técnico da fotografia.
- O Grupo apreciará informação respeitante a qualquer trabalhador sério na área da fotografia que tenha escapado à sua atenção e, por último, é favorável à criação de um fórum de fotografia moderna."

segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Oscar Araripe, crianças e pinturas...

Formação cultural é um bem imaterial que se adquire desde pequeno. Nesta sequência de reportagens exibida no programa Jornal do Almoço (RBSTV, Porto Alegre) em 2008, mostramos (uso a primeira pessoa do plural porque na época eu era editor-chefe do programa) como o projeto de uma escola infantil incentiva os pequenos a aprender e interagir com a arte. Um artista era escolhido e, a partir daí, as crianças começavam a tomar contato com a sua obra. Depois, faziam elas mesmas uma releitura do que viam. O mais bacana de tudo é que os artistas estudados pelas crianças também acabam envolvidos no processo e se surpreendiam com o resultado. Uma prova da característica líquida das imagens, ou seja: de como uma obra é apropriada pelo olhar de quem observa e ganha um novo significado. As reportagens a seguir foram feitas em Porto Alegre e Tiradentes (MG), onde vivia o artista Oscar Araripe.
As apresentadoras são Cristina Ranzolin e Rosane Marchetti, as repórteres Shirlei Paravisi (Porto Alegre) e Flávia Marsola (Tiradentes). As crianças eram alunas da Escolinha Infantil Caracol.


sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Animação stop-motion com celular

Celular bate foto, manda mensagem, e-mail, faz videos... Cada vez menos "telefone" e mais computador de bolso, o celular está definitivamente incorporado às nossas vidas. Por consequência, nada mais natural que surjam experimentações variadas com os recursos do equipamento. Inclusive as mais criativas. Uma amostra disso é o curta-metragem Gulp, criado pela Sumo Science e produzido pela Aardman, que mostra um pescador indo para a pesca diária. Rodado em locações na Pendine Beach em South Wales, no Reino Unido, cada quadro desta animação stop-motion (técnica que simula o movimento através de uma sequência de imagens estáticas que vão sendo levemente movidas, gravadas e depois editadas em velocidade que permita o efeito) foi gravado usando um celular Nokia N8, com a sua câmera de 12 megapixels e lentes Carl Zeiss. O filme quebrou o recorde mundial para o maior set de animação stop-motion, com mais de 3.300 metros quadrados. Confira!



Os animadores: http://www.aardman.com
Os artistas de areia: http://www.sandinyoureye.co.uk/

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Aviões não combinam com cameras

Como diria o Barão de Itararé, de onde menos se espera, daí mesmo não sai nada... O mundo digital é cheio de novidades, avanços, coisas legais, mas também traz problemas. Mundo novo, novos problemas, reclamaria um saudosista. Esta é para quem gosta de viajar de avião e leva sempre sua camera digital. Se ainda não sabe, cuidado - você pode estar danificando seu equipamento!

O texto a seguir foi publicado no site da Digital Photographer :

Você já levou sua câmera digital numa viagem de avião? Toda vez que faz isso, está destruindo pixels do seu sensor. Existe um ótimo motivo para o fato de que todos os fabricantes de câmeras despacham seus produtos de navio! Na alta atmosfera por onde os aviões trafegam em cruzeiro, há uma elevada incidência de raios gama e raios cósmicos, fótons de alta energia que trafegam livremente pelo espaço. Não nos fazem mal durante a viagem, mas afetam sensores digitais. Em alguns tipos de sensores, a destruição de um pixel significa a morte para toda uma fileira à qual ele pertence, pois a leitura das voltagens dos photosites ocorre por fileiras. O filme “Superman Returns” foi o primeiro rodado com uma câmera digital Genesis, a qual foi despachada de avião para a locação de filmagem. Ela viajou dos EUA para a Austrália de ida e volta. A equipe de pós-produção descobriu que a imagem possuía finos riscos pretos verticais, correspondentes aos pixels danificados no transporte.
Qual é a solução dos fabricantes para não serem processados pelos consumidores por essa vulnerabilidade fundamental em suas câmeras? Aprenderam a detectar e preencher os pixels mortos automaticamente, via software. Toda câmera digital atual possui essa função.
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Nota de rodapé: Tudo bem, parece ser uma solução possível, mas o dano ao equipamento já está feito. Esta substituição é algo como uma maquiagem, nunca é a mesma coisa que o original. Por isso, cuide do seu equipamento e avalie os riscos de levá-lo na próxima viagem.

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Pata!

Peço licença pra falar um pouco de música. Aliás, um pouco de música e imagem. Os anos 80 registraram o boom do formato videoclip. Antes, os artistas gravavam "musicais" ou simplesmente videos com suas músicas. Eram basicamente registros de apresentações. A partir dos 50´s começa a haver uma interação mais efetiva. Nos 60´s os videos (que ainda não eram clips) eram caracterizados pela estética dominante, resultado da associação ao movimento hippie (ver o post estética anos 60 neste blog). Nos 70´s e 80´s, já como videoclip, os videos "contavam uma historinha" para descrever a música - e, cá prá nós, o visual era bem ruinzinho... Os 90´s quebraram este raciocínio em linha reta e, de lá para cá, a palavra de ordem é criatividade. Bom, todo esse blá-blá-blá é pra mostrar aqui o mais novo clip de uma das melhores bandas brasileiras. Sem mais demora, com vocês a Pata de Elefante!



Créditos:

Clipe: Pesadelo no Bambus -
Produção, direção e finalização: Cartel Graphics
Roteiro: Sandré Sarreta
Ilustração: Ronibas
Colorista: Sandré Sarreta
Animação e Montagem: Celso Bazuca, Ronibas

A Pata de Elefante surgiu em janeiro de 2002, em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, formada por Gabriel Guedes, Daniel Mossmann e Gustavo Telles. O trio se diferencia por fazer rock instrumental com ênfase nas melodias.

terça-feira, 16 de agosto de 2011

A experiência do celular

Seja pela portabilidade, seja pela discrição, o celular é um baita aliado para fazer imagens. Mais que isso, deveria ser visto como um instrumento de treino e educação do olhar. Como as possibilidades de interferência são mínimas, tendo em vista que a maioria dos ajustes são pré-definidos no aparelho, resta prestar atenção num aspecto fundamental: composição. A maioria das imagens com celulares tende a ser deficiente em termos de definição, o fotógrafo acaba recuperando um fundamento ancestral, do tempo das máquinas de filme, que se perdeu com a chegada das digitais: o capricho na hora de enquadrar e tirar a foto. Luz, enquadramento, composição são elementos fundamentais para que as imagens fiquem boas.

Macetes


Existem alguns conselhos para obter imagens de melhor qualidade com o celular: chegar mais perto do que se quer registrar, buscar locais de boa iluminação, segurar firme o aparelho (já que é bem mais suscetível a tremidas do que uma camera fotográfica ou de vídeo), conhecer bem o equipamento (aprender a usar os recursos pré-definidos) são alguns deles. Na internet já há centenas de sites dedicados exclusivamente às imagens feitas com celular, o que significa um movimento no sentido contrário ao dos que se opuseram ferrenhamente ao uso de celulares como cameras.

Filtros e aplicativos


Não vou voltar ao tema do Instagram (ver dois posts sobre o assunto neste blog). Mas não há como negar que existem - em especial no I-phones - inúmeros apps para fotografia que ajudam bastante a melhorar as imagens. Há quem diga que, na verdade, estes filtros mais servem para encobrir imperfeições (foco ruim, baixa iluminação, ausência de contraste) do que oferecer uma imagem melhor. Isto até pode ser verdadeiro em alguns casos, mas existe outra forma de ver a questão: o uso destes filtros acaba se constittuindo em outro tipo de linguagem, que leva a pessoa a desenvolver um senso estético diferente. Nem melhor nem pior, mas diferente. Mais uma vez, o grande diferencial entre uma imagem boa e uma imagem ruim é o conteúdo da foto, a emoção e o senso estético que ela traz. Assim, ninguém deveria ter receio de usar estes aplicativos. A única restrição possível é a da imagem ruim, sem criatividade, pobre de conteúdo e de estética.

Imagens pofissionais?


Por último, uma questão que tem preocupado muita gente: o uso profissional dos aparelhos celulares. Existem inúmeras discussões em fóruns de fotógrafos, e a polêmica está sendo bastante áspera. Infelizmente a maioria das pessoas tende a uma radicalização extremada de suas posições, com a defesa de um ponto de vista fechando a questão para quem pensa o contrário ou é mais flexível. Fato é que, aos poucos, as barreiras vão caindo. Fotógrafos renomados aderem ao celular - inclusive como opção estética - e imagens feitas com o equipamento já ocupam as páginas de jornais, revistas e internet. Sem maiores prejuízos à qualidade. Claro que um equipamento profissional obtém melhores resultados: foco, abertura e velocidade adequados, balanço de branco, além de uma sensibilidade maior no sensor, garantem melhor contraste, equilíbrio de cores, fidelidade à cena real. Além disso, o arquivamento no sistema RAW permite um trabalho de ajustes mais preciso nos programas de tratamento de imagens. Por outro lado, cameras e lentes cada vez melhores nos celulares vão diminuindo a distância aos equipamentos profissionais. Por enquanto, pelo menos para o jornalismo, ainda vale a regra de estar no lugar certo na hora certa: pouco importa a forma de registro do fato, o que importa é ter a cena gravada e a sua relevância. Para quem tem no registro de imagens o interesse artístico, a situação é ainda mais flexível e o celular pode até ser usado como instrumento de uma linguagem diferenciada. A última fronteira ainda pode ser a da publicidade, em que o controle de ambiente - com definição de cor e luz - ainda é melhor captado pelo equipamento profissional.

PS: as cinco últimas fotos são minhas e foram tiradas, de baixo para cima, com um celular Sony Ericsson(primeira), com um I-phone (as duas seguintes) e as duas últimas com um blackberry antes e durante o show de Paul McCartney em Porto Alegre em 2010.

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Preto & Branco

Imagem da primeira fotografia permanente do mundo feita por Nicéphore Niépce, em 1825.

Qual o significado estético e psicológico de uma imagem em preto e branco? A quais associações mentais isto nos remete? Houve um tempo em que somente era possível fazer imagens nestas condições, por um simples e técnico motivo: não havia filmes coloridos.


A chegada do trem à estação, dos irmãos Lumiére (1895), o primeiro filme da história

No cinema e na televisão, durante muito tempo o uso de imagens em preto e branco era uma representação que remetia ao passado; quando um personagem lembrava uma cena, fazia isto em P & B. Mas este é um código antigo, há muito cineastas e profissionais de televisão encontraram outras formas de representação do passado. Não há como negar o impacto causado por uma imagem em P & B. A cena costuma ganhar um viés dramático mais intenso. Sem a profusão natural de cores para confundir a atenção, concentramos nosso olhar em detalhes, texturas, contrastes.

Fotografia em P & B

Henri Cartier-Bresson (ver post sobre ele neste blog) dizia que "a vida é colorida, a fotografia é preto e branco". Bresson vivia num tempo em que o filme era basicamente em P&B e, mesmo depois do surgimento dos filmes coloridos, ainda considerava o modelo original mais interessante. A fotografia nasceu em preto e branco, no inicio do século XIX. Desde as primeiras formas de fotografia que se popularizaram, como o daguerreótipo, aproximadamente na década de 1830, até aos filmes preto e branco, houve muita evolução técnica, e diminuição dos custos. Os filmes P&B têm uma grande gama de tonalidade, superior mesmo aos coloridos, resultando em fotos muito ricas em detalhes. Por isso as fotos feitas com filmes P&B são superiores ás fotos coloridas convertidas em P&B. As fotografias preto e branco se destacam pela riqueza de passagens de tons; a fotografia colorida não capta apropriadamente as nuances sutis de mudanças tonais. Desta forma, a fotografia preto e branco é mais apropriada para a captura de meios tons.


Psicologia

Há muito se sabe que as cores influenciam nossas emoções. Cada pessoa reage de uma determinada maneira às cores. Preto e Branco, bem como os meios-tons, não são classificados como cores, mas como luzes: o branco é a ausência total de cor, ou seja, luz pura; já o preto é a ausência total de luz, não há reflexão de cores.
Observe o que se diz na psicologia sobre o significado do Preto e Branco e dos meios-tons e o que transmitem para quem as vê:


Neutros-Cinzentos: Qualidade, quietude, clássico, natural, atemporal. A cor cinza promove equilíbrio e estabilidade.
Branco: Limpo, puro, inocente, brilhante. O branco remete a paz, sinceridade, pureza, verdade, inocência, calma
Preto: Forte, clássico, elegante, misterioso, poderoso. O preto permite a auto-análise, a introspeção, pode significar também dignidade, está associado ao mistério.

domingo, 14 de agosto de 2011

Foto, vídeo ou ambos?

Um antagonismo desaparece a passos rápidos. Mesmo que alguns ainda torçam o nariz ("você quer uma camera fotográfica ou uma camera de vídeo?"), a aproximação entre as duas formas já é fato quando se fala nos principais equipamentos fotográficos. Seja por interesse do público, seja por jogada comercial das grandes fabricantes, a realidade nos mostra equipamentos capazes de registros tão qualificados que os habilitam até mesmo a voos maiores. Já não são poucos os vídeos profissionais feitos com cameras fotográficas. Claro que, mesmo gravando em alta resolução (1080 pixels), ainda persiste o problema que diferencia um vídeo de um filme: a menor latitude de exposição, ou seja: a faixa de variação de exposição que vai dos tons mais claros aos mais escuros, na película, obtém melhor definição - fazendo, por exemplo, que um objeto localizado numa zona escura da imagem apareça com detalhes. Mas se a comparação passa ser feita com outras cameras de video, a diferença cai e os pontos de discordância passam a ser outros: condições de uso, facilidade de manuseio, etc. De qualquer modo, até o momento a incorporação do vídeo pelo equipamento fotográfico não está representando nenhum problema para a atividade-fim original. Continua-se a bater fotos com cada vez mais qualidade e ainda surge o ganho da possibilidade de registrar imagens em movimento.
Para conferir isso na prática, a seguir veja dois vídeos feitos com duas das cameras mais populares entre as "quase profissionais" do mercado: Nikon D300S e a Canon EOS 7D.




terça-feira, 9 de agosto de 2011

Filme fotográfico - sobrevivência

A pergunta foi lançada pelo site photographytalk: você acredita que o filme fotográfico pode voltar?
Mais que uma curiosidade, a pergunta reflete uma onda revival, que há alguns anos fez renascer os discos de vinil. Na mesma onda vem também o fascínio pelo tipo de imagem produzida por cam
eras de filme. Daí a explicação por tanta polêmica e interesse nos filtros e aplicativos que simulam efeitos de cameras antigas (ver os posts intitulados Instagram que já publiquei aqui).
Os defensores do filme ainda argumentam com a qualidade insuperável do processo físico-químico: a precisão da luz que incide sobre a película é muito superior à que ocorre sobre um sensor. Pelo menos por enquanto. Por outro lado, a versatilidade e a facilidade de operação das cameras digitais não encontra parâmetros entre os equipamentos antigos. Nas digitais, numa mesma plataforma (estou empregando o termo de forma proposital, ainda que um tanto impreciso) estão a antiga camera, o laboratório e, em alguns casos, até o meio de publicação ou exibição. De fato, o filme não deixou de existir; tampouco as cameras de filme. É só entrar em sites de material fotográfico para encontrar diversas ofertas, mais ou menos sofisticadas.
A pergunta que vem a seguir é "qual meu objetivo, para o quê quero este ou aquele equipamento?". O mais provável - e aqui vai a minha opinião - é que as cameras de filme devem sobreviver
como exercício estético, em trabalhos de estúdio ou concepções artísticas, não como aplicação profissional ou amadora para o dia-a-dia.

Confira as outras respostas que surgiram na discussão dos internautas da photographytalk:

http://www.photographytalk.com/forum/photography-general-discussion/108485-do-you-think-film-photography-could-ever-have-a-come-back?limit=15&start=15#123851

sábado, 6 de agosto de 2011

Morell - a redescoberta de um princípio da fotografia

E quando se pensa que nada mais pode ser criado, inventado, modificado, eis que surge a interminável capacidade humana de pensar e agir diferentemente dos padrões normais...

A ideia do artista cubano Abelardo Morell foi criar câmaras escuras em quartos por onde passava. Para isso, toda luz era isolada do ambiente e apenas um furo deixava entrar luminosidade. Uma pinhole gigante. Assim, a paisagem externa era projetada na parede do quarto e Abelardo, de dentro da câmara escura, fazia uma foto da projeção.

Nascido em Cuba em 1948, e radicado nos Estados Unidos da América, Abelardo Morell é considerado um dos fotógrafos mais inovadores de um grupo de fotógrafos vanguardistas que, nos anos 90 do século XX, revelou-se contra a noção da fotografia como uma atividade culturalmente controlada.

Em contraste com os artistas pós-modernistas que, na década de 80, procuravam criticar o papel da fotografia dentro da cultura moderna, Morell – juntamente com Ellen Carey, Susan Desges, Adam Fuss, David Goldes, Mike e Doug Starn – concentrou os esforços em redescobrir o senso elementar de admiração e surpresa que a visão fotográfica provocava nos seus inventores e no primeiro público.

A série Câmara Obscura surge inspirada por um desejo em demonstrar o princípio da câmara obscura (literalmente, um quarto escurecido) aos seus alunos da universidade onde lecionava. Esta série foi também influenciada por seu filho Brady, cuja visão infantil levou Morell a revigorar o próprio olhar infantil e torná-lo objeto do trabalho fotográfico.

A capacidade de Morell de ver o mundo como novo e surpreendente evoca não somente a perspectiva de uma criança, mas também a de um completo estranho às tradições pictóricas do ocidente.



O video a seguir revela o modo de trabalho deste artista surpreendente.

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Lambe-lambe

Uma evocação ao passado. A figura do fotógrafo de rua, também conhecido com lambe-lambe, traz à mente a idéia de uma vida algo ingênua e romântica nas cidades. Imagina-se sempre homens de terno e chapéu, acompanhados por suas senhoras e filhos, ajeitando o nó da gravata para a foto. Não há espaço neste quadro para a velocidade, a urgência e o descaso dos dias atuais. Tirar um retrato - sim, os lambe-lambe eram fundamentalmente retratistas - era uma espécie de evento pessoal e familiar.

Testemunhas de uma época

Tipos comuns nas primeiras seis décadas do século XX, nas praças, os fotógrafos lambe-lambe orgulhavam-se em dizer a marca da lente que usavam. Era a essência do negócio. Uma pesquisa feita por FRÓES, LEONARDO "Os lambe-lambe" – in Coisas Nossas Rio de janeiro, RJ/MEC/FUNARTE, 1978, revela que quem criou os chamados fotógrafos de jardim, “photographo de português” foi o rei. Em 17 de maio de 1911, a revista Fon-Fon publicava o anuncio: “Trabalhe por Sua Conta, que uma empresa de Nova York EUA anunciava prometendo lucros grandes e certos. Era o tempo em que o fotógrafo ambulante tinha status. Os anúncios exibiam ao lado da maravilhosa “machina photographica” um sujeito elegantemente vestido de terno, gravata e chapéu de feltro.

Origem do termo “lambe-lambe”

Existem algumas explicações para a origem do termo: lambia-se a placa de vidro para saber qual era o lado da emulsão ou se lambia a chapa para fixá-la. Ou a origem pode estar ligada ao antigo processo da fotografia.


O último lambe-lambe

O texto a seguir foi escrito por Ricardo Chaves, o "Kadão", chefe da Fotografia do jornal Zero Hora e traduz perfeitamente o sentimento de quem chegouu a conviver com estas típicas figuras das ruas das cidades. Fala sobre a aposentadoria do último lambe-lambe de Porto Alegre (que na prática não chegou a se consumar, uma vez que ainda pode ser encontrado aos fins de semana no tradicional brique do Parque Farroupilha, ou em eventos como a Feira do Livro, que ocorre nos meses de outubro/novembro na praça da Alfândega, no centro de Porto Alegre. As fotos que seguem são minhas, feitas durante a Feira do Livro de 2010.
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Do último lambe-lambe ninguém vai esquecer

Nestes tempos de imagens digitais vistas na tela do computador, já estamos quase esquecidos do prazer, além de visual, tátil, de ter uma foto de papel em nossa mão. Uma foto, antigamente, era um objeto e era tratada como tal.
Algumas, muito especiais, ganhavam dedicatórias, e eram presenteadas em demonstração eloquente de amor ou amizade. Se fotos em papel são cada vez mais raras, isso não significa que o papel da fotografia tem sido menos importante. Ao contrário.
Cada vez mais as pessoas fazem um número maior de fotografias. Agora todos são fotógrafos, e todo mundo fotografa o tempo todo. Com telefones celulares e câmeras digitais singelas ou sofisticadas, o importante é registrar tudo. E tudo é registrado. E, mesmo que não seja impresso, é, em seguida, “anexado”, “postado”, “enviado”. Se a fotografia continua prestigiada, o papel do fotógrafo já não conta com a solenidade dos velhos tempos.
Claro que, quando se exige qualidade e precisão, ainda vamos em busca de um profissional qualificado, alguém especializado, e capaz. O que não existe mais é aquele mistério do alquimista, a magia de transformar, na penumbra e às escondidas, o latente em real. Com a invenção da fotografia, os fotógrafos estrearam sua condição de protagonistas. Sua presença e movimentação sempre foram tão toleradas quanto inconvenientes, mas, afinal são criaturas a serviço da memória, e têm de fazer seu trabalho aqui e agora. Quem mais pode subir ao altar da igreja, num casamento, não sendo noivo, padrinho ou padre? A imediata identificação do equipamento justifica sua participação. O fotógrafo está ali como símbolo. Varceli Freitas Filho é um símbolo. Ele é o último lambe-lambe de Porto Alegre.
Merece a aposentadoria especial concedida a cidadãos importantes para à cidade, pleiteada pelo prefeito em exercício aos vereadores nesta semana. Ele tem 55 anos e aos 12 já esfregava a mão molhada nas fotos imersas num balde d’água sob o tripé da máquina fotográfica operada pelo pai, morto em 1999, e que, por 58 anos, trabalhou, fazendo retratos diante do Chalé da Praça XV.
Varceli Filho herdou de Varceli pai mais do que uma câmera, um ofício. Feliz com a possibilidade de a iniciativa resultar em um apoio concreto, ele se diz reconhecido e estimulado a continuar representando seu papel e comparecendo ao Brique da Redenção aos domingos, ou, eventualmente, ao Chalé, Feira do Livro, ou a qualquer evento que tenha a ver com a vida da cidade.
O benefício equivaleria a uma espécie de tombamento, e nada mais justo do que a preservação da imagem do que ele representa.
Ao vê-lo em pé, ao lado da câmera, com seu boné e sua gravatinha borboleta, somos remetidos a outros tempos, evocamos outra época e uma cidade muito diferente da atual, cujo único testemunho são alguns prédios e poucas pessoas, como Varceli, dispostas a manter as coisas como elas eram. Pode ser um simples papel, mas suficientemente importante.

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

Cartier-Bresson

Quase nada existe que possa ser acrescentado ao que já se escreveu sobre o mestre da fotografia Henri Cartier-Bresson ( França, 1908-2004). Dono de um olhar único, Cartier tinha a habilidade insuperável de fazer dos flagrantes, dos instantâneos, o mesmo que se espera de uma foto produzida. A captação do momento exato, a captura da expressão verdadeira, do movimento certo, da cena composta como se cada elemento tivesse sido orientado a estar em sua posição... enfim, faltam palavras para descrever o que este fotógrafo fez. Ainda mais numa época em que não existiam quase recursos de pós-produção. Munido apenas de uma camera Leica (talvez o único diferencial real, já que se tratava de um equipamento fora de série), Cartier-Bresson encantou o mundo com suas imagens.

Biografia

Cartier-Bresson morreu aos 95 anos de idade. Repórter fotográfico com trabalhos feitos para revistas como "Life" e "Vogue", fundou em 1947, ao lado de Robert Capa e outros profissionais, a agência de fotos Magnum. Desprezava fotografias arranjadas e cenários artificiais; dizia que os fotógrafos devem registar sua imagem de uma forma rápida e acurada. Seu conceito de fotografia baseava-se no que ele chamava de "o momento decisivo" - o instante que evoca o espírito fundamental de alguma situação, quando todos os elementos externos estão no lugar ideal.

Segundo Cartier-Bresson, "a fotografia nada mudou desde a sua origem, exceto nos seus aspectos tecnicos, os quais não são minha preocupação principal. A fotografia é uma operação instantanea que exprime o mundo em termos visuais, tanto sensoriais como intelectuais, sendo também uma procura e uma interrogação constantes. É ao mesmo tempo o reconhecimento de um fato numa fração de segundo, e o arranjo rigoroso de formas percebidas visualmente, que conferem a esse fato expressão e significado".



Este pequeno documentário traz um pouco das ideias de Cartier-Bresson em suas próprias palavras. Um dos momentos que mais chama a atenção é quando ele fala sobre como deve ser o olhar de um fotógrafo. Confiram:

terça-feira, 2 de agosto de 2011

Como fotografar uma sequoia

Os fotógrafos que prestam serviços para a National Geographic estão sem dúvida entre os melhores. Não só pela habilidade e qualidade das imagens, mas também pela criatividade e ousadia das propostas. Um ótimo exemplo é o do fotógrafo Michael "Nick" Nichols. Ele precisou formar uma equipe para enfrentar um desafio gigante: fotografar em toda sua grandiosidade e extensão uma sequoia. Estas árvores são consideradas verdadeiros "fósseis vivos", devido a longevidade de algumas espécies. A sequoia-gigante é a maior árvore do mundo em termos de volume. Ela cresce em média 50-85 m e 5-7 m em diâmetro. A sequoia-gigante mais velha conhecida possui 4.650 anos de idade e se encontra no Parque Nacional da Sequoia, na Califórnia. Medidas recordes de sequoias como 715 metros de altura e 8 metros de diâmetro já foram reportadas. O esforço e a inventividade para fazer a foto valem a pena ser apreciados neste vídeo.

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Imagem, tantas definições...

Como este blog se propõe a apresentar o assunto imagens num sentido mais amplo, fluido, líquido - e como por vício de origem acabo muitas vêzes preso à fotografia e ao vídeo, ainda que já tenha postado sobre pintura e desenho - resolvi fazer uma pequena investigação sobre o(s) significado(s) da palavra "imagem" - e achei muito material interessante. Como diz o ditado, "uma imagem vale mais do que mil palavras". Repasso agora parte do que encontrei:

Conceitos

Por alguma razão, o termo "imagem" tem sido utilizado como restrito à imagem em movimento, fotográfica ou eletrônica, dos meios audiovisuais. O conceito, na verdade, transcende em muito esse pequeno recorte e diz respeito a toda visualização construída pela ação do Homem. Neste sentido, inclui todo e qualquer objeto que possa ser percebido visualmente — e, portanto, esteticamente.
Desde os primórdios da história do conhecimento, filósofos e pensadores se debruçam sobre a complexa relação que une imagem e realidade, bem como sobre as respectivas definições.
A retórica medieval define imagem como “aliquid stat pro aliquo” algo que está em lugar de uma outra coisa, apontando já para algo que pode ser fabricado. No entanto, qualquer que sejam as posições teóricas adotadas, parece incontornável que se entende por imagem algo utilizado para representar uma outra coisa, na sua ausência, existindo em qualquer imagem três dados incontornáveis: uma seleção da realidade (que em casos-limite pode passar por excluir qualquer representação da realidade – veja-se a pintura não-figurativa), uma seleção de elementos representativos, uma estruturação interna que organiza os referidos elementos. Da relação complexa que une imagem e realidade lhe advêm o seu carácter quase mágico que permite simultanemanete representar um objeto e sua ausência. De um ponto de vista pedagógico, também durante longo tempo foi a imagem alvo de grande desconfiança pois, “se é imprópria para produzir argumentação, a imagem é porém notável para intensificar o ethos e o pathos.”

Imago

Imagem (do latim : imago) significa a representação visual de um objeto. Em grego antigo corresponde ao termo eidos, raiz etimológica do termo idea ou eidea, cujo conceito foi desenvolvido por Platão. Já no livro sexto da República, Platão se debruça sobre o problema, definindo imagem como “... primeiramente [as] sombras depois [os] reflexos que se vêem nas águas ou na superfície dos corpos opacos, polidos e brilhantes, e a todas as representações semelhantes”. Aristóteles, ao contrário, considerava a imagem como sendo uma aquisição pelos sentidos, a representação mental de um objeto real, fundando a teoria do realismo. Em senso comum, envolve tanto o conceito de imagem adquirida como a gerada pelo ser humano, em muitos domínios, quer na criação pela arte, quer como simples registro foto-mecânico ou digital, na pintura, no desenho, na gravura, em qualquer forma visual de expressão da idéia.

Análise da Imagem

A análise da Imagem é uma atividade semelhante à análise do Discurso, mas tendo por objeto analítico especificamente imagens. Este tipo de estudo ou técnica tem por método interpretar e "desconstruir" as imagens, em conteúdo e forma, considerando o contexto histórico-social de produção, o autor (emissor) e o público (receptor) que participaram de sua criação, com a finalidade de compreender e identificar sentido nas imagens. A Análise da Imagem considera também o aspecto do Discurso Estético.

Uma imagem é pictórica quando produzida por ordenação de pigmentos sobre algum suporte, geralmente utilizando técnicas de fotografia, desenho, pintura, gravura e outras das artes visuais. A imagem pictórica pode ser figurativa, se representar algo existente materialmente na natureza (ou supostamente existente, como no caso de figuras mitológicas, ou abstrata, se não se prender a nenhuma representação material).


Imagem nas relações sociais

Existe ainda uma interpretação mais subjetiva sobre o significado de "imagem". É aquela que diz respeito às impressões que causamos nos outros. É formada, segundo os especialistas, nos primeiros segundos de contato visual. Assim, podemos imprimir uma primeira ideia de simpatia, formalidade, tristeza, alegria, seriedade, enfim, toda a série de sensações que podemos provocar com a nossa presença. Neste sentido, portanto, imagem diz menos respeito a uma representação visual do que sobre um sentimento, uma sensação, que não são necessariamente do campo dos cinco sentidos, mas daquele imponderável fator humano das percepções.

Imagem Digital

Do ponto de vista da Computação Moderna podemos dizer que uma imagem contém uma imensa quantidade de informações e que um observador humano interpreta frequentemente globalmente e qualitativamente. Se falarmos mais concretamente, por exemplo do ponto de vista da Ótica, uma imagem é um conjunto de pontos que convergem num plano, mas se falarmos de forma abstrata uma imagem é um suporte para que realizemos trocas de informações. Quando aplicado a física experimental uma imagem pode representar o fenômeno estudado ou ainda ser uma organização de dados sob a forma bi-dimensional (matricial). A imagem digital é a "materialização" de grande parte dos processos da Computação Gráfica e das Técnicas de Processamento Digital de Imagens. É também o ponto de partida da sua análise quando falamos de Visão por Computador. Podemos afirmar que a diversidade de aplicações da área de Análise de Imagens está na realidade associado ao fato desta carregar em si uma informação, e neste sentido ser comum á várias áreas.