sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Bom gosto, mau gosto?

Dia desses li num site de fotografia um artigo sobre "mau gosto" em imagens. Entre tantos conceitos vagos e imprecisos - "brega", "cafona", etc - o autor se deu ao trabalho de listar supostos exemplos do que seria de mau gosto ter num portifólio profissional. Acontece que o nosso paladino da estética se emaranhou na areia movediça dos conceitos vagos e pouco específicos. Na verdade o que fez foi atribuir a uma série de efeitos de pós-produção a condição de "bregas e cafonas". Talvez mal saiba o autor que esta discussão é mais antiga que o mundo e não há conceito universal que consiga dizer, definitivamente, o que está acima ou abaixo de uma linha de pretenso "bom gosto".

História

Historicamente existem fatores que delimitam a estética na atividade artística e na vida social. As elites econômicas ou políticas costumavam ditar as normas do que era aceitável ou não. Nas cortes dos reis europeus, por exemplo, a cor da pele deveria ser imaculadamente branca, no máximo com um leve rosado - daí o uso de talco e outros produtos para deixa a pele alva. Uma cútis queimada denotava a origem social do indivíduo - exposto ao sol pela necessidade de trabalhar, estava automaticamente excluído da "elite".
O século XX trouxe uma quebra de paradigmas sem precedentes. Parte pela ação da própria sociedade, parte pela necessidade da indústria de consumo de expandir mercados, o fato é que pouco restou dos "certos e errados" de outras eras. Vivemos um tempo de conceitos líquidos (arrá!), como diria Zygmunt Bauman, um dos inspiradores deste blog.


Discussões, discussões...

O campo artístico talvez seja um dos últimos que ainda guarda resquícios do dogmatismo passado. Não raro debatedores trocam farpas em defesa de valores estéticos opostos. Discussão infrutífera, tendo em vista que raramente alguém muda de opinião. Intelectuais ainda se veem na condição de "defensores" de uma suposta qualidade artística que não poderia ser produzida ou mesmo apreendida pelas massas burras e ignaras... Uma pretensão e tanto, diga-se de passagem. A liquidez de conceitos derruba estas posturas intransigentes e conservadoras (sim, mesmo entre os "mudernos" e descolados existe muito de conservadorismo) na medida em que o tempo se encarrega de desfazer teses e pré-conceitos. Um exemplo na própria fotografia: aquelas imagens meio lavadas, com cores pouco definidas e um tom entre o sépia e o verde das fotos tiradas com cameras polaroid hoje é cult e vários programas de edição tratam de oferecer presets para deixar fotos atuais com aquele ar retrô. Com certeza, em alguns anos (meses? semanas?) tais efeitos estarão relegados ao esquecimento, sendo considerados datados, cafonas, etc, talvez pelas mesmas pessoas que hoje acham tudo isso muito legal. Na moda então, nem é bom falar nos tantos exemplos: os anos 70, que já foram sinônimo de mau-gosto, depois voltaram como cult total. É a vida...

Liberdade


Dito isso, minha opinião é a mesma e marca este espaço desde o começo: não há porque estabelecer limites e regras em atividades que são eminentemente criativas e subjetivas. Gostar ou não de algo é valor pessoal e intransferível. Conceitos estéticos dependem de inúmeros fatores, mas o principal me parece ser a base sócio-cultural de cada um. Claro que existem estilos mais simples e diretos de produção artística, facilmente assimiláveis por um número maior de pessoas. Em tese, no extremo oposto, as produções conceituais, experimentais, que buscam a diferenciação do senso médio estariam no espectro de um "refinamento cultural". Só que nada disso tem valor se vier carregado de dogmas e uma suposta "superioridade" estética. É interessante notar como alguns dos maiores gênios da humanidade, cedo ou tarde pregaram uma postura de humildade diante do conhecimento como a melhor forma de posicionamento pessoal. O "saber que pouco se sabe" ajuda a colocar o ser humano numa dimensão mais adequada, derruba falsos pedestais e termina com o ar blasé de uma suposta intelligentzia, imersa no pântano de um mundo em transformação permanente, cada vez menos disposto a dar relevância ao ataque dos falsos "pensadores".

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